6.10.05

corra, gabiru! corra!

das narinas saíam dois filetes espessos de catarro misturado com tinner - parecia até claras em neve. a porta traseira do ônibus, parado na rodoviária novo rio, estava aberta e ele aproveitou a brecha - nessas horas de fuga há sempre uma portinhola aberta. no seu encalço um moleque tão maltrapilho quanto, porém muito mais novo, que o acusava de ser bandido. que espécie de bandido? sem camisa, sem chinelo, sem desodorante e carregando um saco plástico cheio de latas amassadas e outros tipos de "coisas-que-ninguém-quer". o ônibus partiu, o moleque desistiu da caçada e o gabiru ficou. num sobressalto de "opa! que porra é essa?!" um homem negro e quadrado feito um guarda-roupa levantou-se. parecia um vigilante à paisana, desses que garantem a ordem nos shopping centers a céu aberto. não adimitiria que aquele ser vivo fugitivo, fedido e com aquelas narinas nojentas ficasse um minuto dentro do coletivo. "pô, mah êlis keren me ajuntah!!!!", suplicou apontando para fora. o à paisana não quis saber: "fora!", e nisso empurrava o pilantra escada abaixo e mandava o ônibus parar. o "coleguinha" do lado de fora voltou a ficar na espreita e insistia "isso é o maior bandido". inesperadamente, uma senhora fez questão de se manifestar contra o à paisana: "seu sanguinário!!!". aquilo pareceu desarmar a intenção do negão, já nos seus quase sessenta anos e o ônibus trôpego partiu novamente. ele deixaria o fugitivo um ponto depois. naquele momento, tão longo quanto todos os momentos de constrangimento da vida, ele ficou parado no meio do ônibus arfando e tentando limpar as ventas com as mãos. as pessoas se afastaram. com certeza, ele nunca poderia imaginar que ia passar por essa, logo hoje. ficar ali exposto aos olhos daquelas pessoas de narizes limpos e banho tomado, sendo esculachado pelo à paisana e defendido pela senhora indignada ("ele também tem sangue correndo nas veias que nem você!! tá? seu favelado da cidade de deus!"). o ônibus parou e o desmilingüido saiu empurrado e se defendendo ("eu não sou pilantra não! eu não sou pilantra não!"). e sumiu das nossas vistas arrastando sua sacola com latas amassadas. sumiu de nossas vistas até o próximo incidente, a próxima manchete de jornal ou o próximo b.o.

5.10.05

liquidação geral

não é raro (aliás é muito comum) andar pela babilônia hc e ter que se desvencilhar dos distribuidores de panfleto. atitude antipática, eu sempre recuso agradecendo o presente educadamente. há os famosos "compro ouro", "vendo minha mãe", "83% no seu ticket", "desfazemos trabalhos", e vai por aí. hoje, na rua do ouvidor, uma mulher negra e gorda, com um decote feneroso colou em mim e estendeu a propaganda cochichando: "bucccccetão de 10!". era daquele lendário centro de lazer que aceita ticket refeição e vale-transporte . não era o dela, afinal ela era apenas uma marketeira, mas foi uma violência quase surda. já tinha sido abordado por uns caras ensebados, suados, drogados ou sifilíticos que perambulam na uruguayana oferecendo genitálias (não as deles, que fique claro, mas de outras doadoras). eles sempre pareceram ter uma expressão de tremenda generosidade, como se estivessem me revelando uma tremenda mina de ouro. não sei se eles fazem uma interpretação de minha fisionomia que os encoraje a fazer tamanho estardalhaço. será que tenho cara de virgem ou de quem tem problema de ereção? ou que pareço ser alguém que não gosta de sexo com higiene?
fora isso, fiquei pensando se eles têm algum tipo de tabela nesse negócio. sim, porque se há um buccccetão de 10, pode haver também um de 15, outro de 20 e outro de 100. e qual seria a diferença? se levasse essa investigação para a prática, ih, e o pior!!!, a fundo, perigava terminar meus dias na fila da santa casa de misericórdia, mais precisamente no ambulatório do departamento de reconstruções funcionais.
conclusão: (cole aqui seus pensamentos).
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