é proibido se jogar pela janela
às vezes, alguma coisa pode dar errado na nave-mãe dessa empresa telefônica. bem, estou sendo até condescendente demais, as coisas estão sempre dando errado e a fila de reclamações na anatel e procom vai aumentando e os gestores ganhando placas de gordura nervosa em suas coronárias. é nessas horas que a gente manda aquela do leão da montanha: "saída pela direita" e sai saindo. meto r$ 0,45 na vending machine e colho um pouco de cocaína preta de trabalhador diluída em água quente. desço para o entrepiso, um andar fantasma entre o quarto e o terceiro andar, onde fumantes se refestelam, famintos se satisfazem, casais copulam e a turma da limpeza zanza. sento no parapeito e sorvo meu café. na minha frente, após toda a geografia de santa teresa, está ele lá longe em cima do morro. faço uma promessa idiota: "quando for demitido e ganhar 100 mil reais de indenização, subo o corcovado de joelhos e me posto em frente ao cristo para agradecer a graça". estou quase assinando mentalmente minha promessa quando o guarda lá embaixo me chama a atenção. "ô num pode sentar aê não!". nessas horas a gente finge que é surdo para ganhar mais um tempo. os lábios dele continuaram se mexendo. eu mesmo tentei emular sua fala: "tá surdo porra? pra entrar aqui você num fez exame audiométrico?!?!?". "fiz sim!", gritei de volta, " com um cagaço danado, tanto que minha pressão arterial subiu". o vigilante não entendeu nada. vi, então, que ele pegou o rádio. de qualquer maneira, o que faria o estatuto do prédio nos impedir de sentar no parapeito? eles devem desconfiar que todos aqui devem andar com as cuecas metidas no rêgo. talvez saibam que a qualquer momento a altura do segundo andar pode nos seduzir e nos convidar para um vôo, uma fuga. já estava no banheiro e tentava sentar meu capacete de cabelo, quando dois guardas e um cara de terno e gravata entram perguntando se era eu que estava sentado no parapeito, bebendo café. porra, essa não! encrenca com a segurança do prédio? podia fingir que era japonês - aqui no prédio tá cheio deles - e mandar um "sorry, io no hablo globish!" e sair saindo de novo. ou então partir pra cima deles ao som de "fucking in the bushes" do oasis, como se estivesse num filme do guy ritchie. eu quebrava o nariz do primeiro e mandava uma joelhada na boca do estômago do segundo. o terceiro, justo o de terno, ia ser na sorte. mas lembrei que todo dia quando chego dou boa tarde a eles. às vezes, até me respondem. isso não ia ter graça. no hospital ou no xadrez, dali a umas horas poderia me remoer em culpa, com pena deles. continuamos naquele impasse. fiquei em silêncio olhando para eles com minha cara de panaca. ou de babaca. um deles ia se exaltar quando escutamos gemidos atrás do biombo do banheiro.
o de terno se apressou em perguntar o que estava acontecendo enquanto se aproximava da cabine. (continua)
o de terno se apressou em perguntar o que estava acontecendo enquanto se aproximava da cabine. (continua)